Diversas pesquisas sociológicas têm apresentado vários aspetos que traçam o perfil da religiosidade popular, dentre elas uma que diz que “é manifestação de grupos sociais subalternos, orienta-se pela tradição e não por uma doutrina, é uma produção religiosa anônima e coletiva.” Segundo (SANCHES, 1983: 33): A religiosidade popular se define pela procura de um sagrado mais próximo da natureza, pela ausência de elaboração, intelectualmente aprofundada e pela solidariedade com a tradição.
A religiosidade popular, geralmente representa a manifestação de grupos sociais desfavorecidos, muito embora, na realidade muitos indivíduos de grupos privilegiados buscam recursos das vivências populares, isto talvez porque a religiosidade popular tenha como marca a não obediência às doutrinas, mas às tradições
O mundo natural é o concreto, que sentimos, que tocamos, enfim, que vivemos, já o mundo social por sua vez é o resultado do nosso relacionamento grupal num determinado meio ambiente. O mundo sobrenatural é o mundo das religiões, da magia, ao qual só temos acesso parcial por meio de determinados ritos e cerimônias.
No nosso país, onde tudo ou quase tudo é explicado pela ciência e pelo pensamento lógico e racional, o lugar para o sobrenatural é bastante limitado, o que não é o caso das sociedades africanas de onde oram trazidos os escravos e que, para estes toda a vida na terra estava ligada ao além.
Para os negros africanos que foram trazidos para cá, a orientação de como agir diante de várias situações da vida era traçada buscando auxílio do além, dos antepassados, dos ancestrais, dos espíritos. Dessa maneira, se um parente ficasse doente, por exemplo, se uma seca arruinasse a plantação, se uma mulher não conseguisse engravidar, ou se fosse preciso descobrir quem havia furtado algo, consultava-se oráculos para que as forças do além mostrassem aas soluções...
Acho que já deu para perceber que é impossível falar de religiosidade popular sem trazer à tona essa perspectiva africana, seria como negar quase que a maior parte de nossa própria história. É a chamada herança cultural nos mais relevantes aspectos, seja na culinária: mungunzá, vatapá, feijoada; seja nos dialetos: caçamba, canga, dengo, cafuné, molambo , caçula, quitute, mandinga, moleque, camundongo, banguê, mocotó, bunda, zumbi, caruru etc., -á propósito, fragmentos extraídos do livro “Casa grande & Senzala” de Gilberto Freire-, ou seja na religião: Candomblé, Quibanda, Umbanda, Mandinga; são práticas ou conjunto de práticas e crenças mágico-religiosas de matrizes africanas que germinaram no Brasil por volta de todo século XIX.
Marina de Melo e Souza ressalta que “o candomblé é um termo que pertence a língua banto, e no Brasil se refere a cultos religiosos de origem ioruba e daomeana.” É no candomblé onde as principais entidades são os orixás: Oxalá, divindade da criação dos seres humanos, soberano: Xangô, divindade dos raios, relâmpagos e trovões,; Ogum, divindade do ferro e dos ferreiros e deus das guerras; Oxosse, divindade das florestas e da caça; Omulu/obaluayie, divindades da varíola e das doenças contqgiosas; Oxumaré, divindade das chuvas e do arco ires; Exu, mensageiro, guardião dos templos, das casas e das pessoas; Iemanjá,, divindade das águas salgadas; Oxum, divindade das águas doces; iansã, divindade das tempestades, dos ventos e dos relâmpagos; Ibeijis, divindade das brincadeiras, da infância e da fecundidade.
Mas não foram só as religiões africanas que deram suas contribuições na construção de novas realidades, o catolicismo negro como ficou conhecido e que foi ensinado aos africanos escravizados pelos senhores serviu inclusive para que eles tivessem devoção a um determinado santo. Os principais eram: Nossa Senhora do Rosário, Santa Efigênia e São Benedito.
Foi convivendo, principalmente na “Casa Grande”, que houve um certo grau de assimilação de todas essas características citadas anteriormente, a princípio, sob perseguições, contudo em se tratando de curandeirismo, muitos senhores e brancos do período colonial se valeram dos préstimos dos escravos negros, principalmente para tentarem se curar do sífilis que naquela época matava impiedosamente.
Ainda hoje tais características perduram envoltas de um sincretismo religioso, muito embora me parece que em dias atuais, tais práticas tomaram conotações diferentes por parte dos maus intencionados. O ritual mais comum encontrado ainda hoje é o das rezadeiras e de muitos rezadores. Quem já não se valeu algum dia de um rezador e de uma rezadeira para no mínimo se curar de “mau olhado e quebranto?” Quem já não procurou, pelo menos uma vez, um rezador ou rezadeira para curar uma ferida em um animal? E as promessas que se faz para encontrar objetos perdidos, para cessar chuvas etc.
Pois bem, em nossa cidade, também nunca foi diferente, principalmente no passado, há mais ou menos meio século atrás onde as pessoas pareciam dar mais atenção “as coisas do além”. Muitas rezadeiras e rezadores estão vivos e continuam com aquela fé inabalável oferecendo os seus préstimos, não só aos menos favorecidos, mas a gente de todas as classes sociais.
Ainda ame lembro de quando eu era criança e que minha mãe me levava para uma “negra velha” me rezar. Chamava-se Dona Zefinha, (falecida), e que morava á Rua Quatro de Outubro, contudo outras rezadeiras e rezadores famosos fazem parte das minhas lembranças, tano vivos como mortos, dentre eles, Manoel do Rosário, Dona Joana, Chica Cobra, Dona Angelina da Vila Nova, Sebastião, Dona Zefinha que reza peitos abertos, Dona Joaninha, esposa de “Zé Badé”, josé Feliciano (falecido), O negro Agostinho, do Sítio Brejo Preto, (falecido), Sr. Benedito do Sítio Jaboticaba, a Negra Justina, do Sítio Cabeleira, (falecida), a Negra Joventina do Sítio Brejo Preto, (falecida), Lica Tolvo, de Brejo Preto, (falecida), Heleno do Sítio Umbaúba, o velho Francisco Galego, (falecido), Feliciano que curava de mordida de cobra e de mordida de cachorro doido, o curandeiro Benedito do Sítio Serraria, Biu leite, (falecido), “Jota”, que reza para afugentar cobras e outros animais peçonhentos dos terrenos Zefa Cobra, e muitos outros que neste momento seria praticamente impossível assinalar, contudo a minha intenção é de relatar o quanto os resquícios da cultura estrangeira está presente no nosso cotidiano que, nesse caso passa a ser chamado de cultura afro brasileira.
Antonio Airton De Barros – Professor Especialista no Ensino de História
Em, 08.08.2018.
Publicado no Myster em, 10 de setembro de 2011.
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